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segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Vai a pé ou vai de trem?

"Senhores passageiros, desculpem a freada brusca".

"Ahn? Ela pediu desculpas pela freada?! Po, que legal! Um pouco de educação e respeito com os passageiros, né?"

Desculpem – agora sou eu que peço -, é que não tô muito acostumada com essas coisas. Ando mais de ônibus, sabe? Pego o metrô só de vez em quando. Isso é menos uma escolha que falta de opção. É que o transporte subterrâneo ainda não chegou nesses lados da cidade.

Por isso fiquei tão impressionada com a fala da locutora no metrô. Achei interessante o fato de alguém se preocupar em orientar a moça a pedir desculpas nessa situação. Achei que esse tipo de coisa não existia no transporte público do Rio.

Acho até que a tal da freada tinha passado despercebida e só fui reparar mesmo porque a moça falou. É que, no ônibus, a gente tá tão acostumada com isso. As freadas costumam até ser piores que aquela. Eu tava de boa... Mas gostei tanto de terem me pedido desculpas...

O motorista do ônibus nunca me pediu desculpas por freadas bruscas. Nem por curvas bruscas, arrancadas bruscas, informações bruscas, buzinadas bruscas, falta brusca de troco, uso brusco de celular enquanto dirige, cigarros bruscos, música em volumes bruscos...

De tão impressionada com o raro gesto de educação, fiquei me questionando o motivo daquela desculpa. Porque, vamos combinar, a moça não tava preocupada se eu fiquei ofendida com a freada, não é? Nem quer que eu ache o condutor uma pessoa gente boa que não frearia bruscamente de propósito. Então, por quê??

Só por educação é uma possibilidade. Mas ainda assim continua sendo estranho. Por mais estranho que possa parecer alguém se impressionar com educação.

Na hora, pensei: "Então, quem anda de metrô com mais frequência é tratado com mais educação, costuma se sentir mais respeitado...? Que legal, as pessoas daqui não devem chegar tão estressadas ao trabalho." Eu sei, nem tudo são flores. Os vagões muitas vezes ficam superlotados, as pessoas empurram para entrar e sair, o trem para muitas vezes entre as estações, atrasando a chegada. OK, eu já passei por isso tudo também. Mas, comparando com a vida de quem anda de ônibus, as pessoas são um pouco mais respeitadas, né? Até ganham desculpas!

E enquanto pensava, eu olhava aquele vagão limpinho, com ar condicionado, bancos preferenciais vagos... E aí, percebi: nós, passageiros, também somos mais educados no metrô. Não jogamos lixo no chão e não sentamos nos bancos de cor laranja ou azul.

Mas, se as pessoas que andam de metrô e de ônibus são as mesmas, por que elas se comportam diferente em um e no outro? Tá, às vezes, não são literalmente as mesmas, mas fazem parte do mesmo grupo heterogêneo de pessoas que utilizam transporte público no Rio de Janeiro. Sem falar nos casos em que são realmente as mesmas, pegando metrô e depois ônibus ou o contrário. Ou então variando entre um e outro conforme o destino. Será que essas pessoas mudam de comportamento?

Enfim, vocês entenderam. Somos tratados diferentes no ônibus e no metrô. Mas nós também somos diferentes num e noutro. E aí, quem nasceu o primeiro: o ovo ou a galinha? Porque, mesmo não chegando a muitas conclusões nessa reflexão, nada me tira da cabeça que os comportamentos estão relacionados de alguma maneira.

Somos mais educados quando nos sentimos mais valorizados? É a velha história da "minha educação depende da sua"? Espero que não, essa máxima não faz muito sentido para mim. Por que não jogamos papel de bala no chão do metrô? E olha que no ônibus, ainda tem uma opção a mais (tão mal educada quanto) que é jogar pela janela. Mesmo assim, o ônibus tá cheio de lixo no chão...

Por que aceitamos ir em pé no metrô para deixar vagos os banco de cor laranja ou azul? O ônibus é mais desconfortável e, em geral, as viagens são mais longas, eu sei. Porém, mesmo quando não há lugar vago metrô, uma pessoa idosa não demora a encontrar alguém mais jovem disposta a levantar e ceder o seu.
Já no ônibus, a disputa é selvagem. Ninguém fica em pé para deixar o assento preferencial vazio e quem o ocupa ainda torce para que a senhorinha que entrou não pare por perto...

Além disso, no metrô, não tem pichações, não tem chiclete colado nem embalagens dobradinhas escondidas entre bancos. Logo, não tem baratas. Eu, pelo menos, nunca vi. Se tiver, certamente é em quantidade bastante reduzida.

Então, por que somos mais bem educados no metrô? Essa dúvida continua me martelando. Por que a passagem é mais cara? Por que é mais confortável? Por que é mais rápido? Ou por que te pedem desculpas por freadas bruscas, justificam uma parada entre estações e se preocupam para que você não enfie o pé no espaço entre o trem e a plataforma?

Ah é! Ainda ia esquecer dessa. No metrô, não dá para não parar no ponto. Ainda assim, há a preocupação para que você esteja atento ao sair. No ônibus, muitas vezes, o motorista já está acelerando quando você coloca o pé no primeiro degrau para subir. Ou já fecha a porta quando você nem terminou de descer. Isso quando não passa direto pelo ponto ou para no meio da rua. E aí, o "vão" para o qual você tem que atentar é de asfalto e nele passam carros, motos, bicicletas, caminhões e outros ônibus. E não tem ninguém pedindo desculpas ou dizendo "fique atento".

Não somos perfeitos no metrô, é claro. Ainda temos que aprender a não ficar parados na porta se não vamos saltar (essa lição vale para o ônibus também), a esperar os coleguinhas saírem antes de entrarmos e a não empurrar quem está indo na mesma direção que a nossa, uma hora todos chegaremos lá.

Aliás, essa do embarque X desembarque, o pessoal do Metrô Rio está tentando nos ensinar. Já até desenhou para ver se conseguimos entender. Em algumas plataformas, há setas amarelas pintadas no chão, não sei se vocês já repararam, bem na direção em que param as portas do metrô. Duas na direção das extremidades da porta, indicando o movimento plataforma – metrô; e uma na direção central da porta indicando vagão – plataforma.

Vendo que desenhar não era suficiente, começaram a colocar fitas (daquelas que ligam pedestais, usadas para organizar filas) separando, na plataforma, a área de quem embarca da de quem desembarca. Resolvido o problema? Não! Quem nos dera, né? Quem está esperando o trem passou a se aglomerar entre as fitas, formando um pequeno curral de pessoas prontas para invadir a primeira porta que se abrir diante de seus olhos, todas pisando na seta justamente na direção contrária ao seu movimento!


Mas, voltando ao assunto à minha grande dúvida, ainda to procurando o que define nosso tipo de comportamento nesses meios de transporte. O que determina quão educados e gentis seremos em cada situação e como decidimos isso? Decidimos isso? É consciente?